Arquivo de outubro de 2008

Delhi – 10 -12 th September 2008

sexta-feira, 24 de outubro de 2008


A cidade de Deli e uma metropole como Sao Paulo, que engloba varias cidades menores, como Nova Deli.

Cerca de oito cidades de importancia historica concentravam-se ali naquela regiao e,embora nem sempre tenha sido a capital da India, Delhi foi palco de varios acontecimentos historicos do pais, principalmente por sua posicao geografica,entre as colinas Aravalli e o rio Yamuna, que permitia o controle das rotas comerciais que circulavam de noroeste até às planícies do rio Ganges.

A maioria das pessoas quando visitam a India, comecam sua viagem por ali e, imagino, o choque da chegada deve ser tremendo. Embora ja estejamos ha algumas semanas no pais, as vezes tambem nos assustamos, com os absurdos das cenas que as vezes encontramos. Uma delas aconteceu logo que chegamos no bairro de Paharganj, onde a maioria dos mochileiros se hospeda. Estavamos atras de hotel, quando de repente vejo um bezerrinho entrando dentro de um bar. O engracado e que as pessoas la dentro continuaram bebendo normalmente, ninguem ousou tira-lo dali, como se ele fosse um cliente antigo…Ele ali paradinho no bar, me lembrou daquelas piadinhas ‘a vaca entra no bar e…., o cavalo entra no bar e….’ Muito loco.

Ja era meio tarde entao deixamos para conhecer a cidade no dia seguinte.

Assim que amanheceu, fomos ate o centro. Nossa primeira parada foi ate o Dariba Kalan, o bazar das pratarias. Ele na verdade esta bem proximo de varios outros, cada qual com o seu ‘tema’ proprio. Ha o bazar dos cartoes, o bazar dos livros, o bazar de tecidos, etc.

Dali seguimos para a Jama Masjid, a maior mesquita de toda a India. Ela fica numa das partes mais elevadas da cidade e dali e possivel presenciar o formigueiro humano formado pelo conjunto de bazares a sua volta.

Quando descemos, o Al organizou um rickshaw para nos levar ate o Forte Vermelho. Ali no centro, a melhor forma de transitar e com estes rickshaws nao-motorizados, ja que em algumas ruas o acesso a veiculos nao e permitido. Mas da um pouco de pena do motorista que, em sua bicicletinha entrou no acirrado transito local.

Chegamos no Forte e passamos por um intenso sistema de seguranca, tivemos que deixar todos os nossos pertences na chapelaria da entrada.

Caminhamos um pouco pelos jardins e pudemos ver um pouco do que restou  de suas antigas construcoes.

Voltamos no final da tarde para a area de Paharganj e ali, num dos restaurantes no topo dos predios, finalizamos o dia, com uma cervejinha, enquanto assistiamos ao caos nas ruas abaixo de nos.

Ao contrario de Mumbai ou Goa, Deli nao deixou uma impressao muito forte em mim, nem boa nem ruim. Foi como se estivesse estado numa cidade grande, mas que bem poderia ter sido qualquer outra. Constinuamos nossa viagem no dia seguinte, rumo a Mc Leaod Ganj, nos Himalayas.

Agra – Delhi – 10th September 2008

quinta-feira, 23 de outubro de 2008

Nao sei se foi por sua historia, ou pela sua magnitude, mas para mim, o Taj Mahal sempre teve uma aurea de surreal sob ele, como aqueles lugares que existem apenas no imaginario, como os Jardins Suspensos da Babilonia. Quando entramos em Agra, ja comecamos ingenuamente a procura-lo e a cada aboboda que viamos nos olhavamos com aquele olhar de ‘sera?’.

Fora o Taj, a cidade nao oferece muitas opcoes turisticas e, por estar ha apenas algumas horas de Delhi, decidimos por apenas deixar as mochilas no locker de um hostel e seguir viagem no final da tarde.

Ja havia ouvido falar que Agra nao e uma cidade muito atraente e, ali conferindo, nao e mesmo. A cidade parece estar em ruinas e tudo beira a desordem, entre suas empoeiradas vias de terra, superlotadas de turistas, rickshaws, animais, casebres bem simples e, varios hoteis.

Fomos seguindo o fluxo de turistas em direcao ao monumento, mas chegando la, decidimos entrar pelo portao do Leste (os outros ficam ao Oeste ou ao Sul, este ultimo e o mais famoso e, com uma fila maior para a entrada). Como todos que visitam o lugar, ficamos perplexos com a discrepancia do valor dos ingressos para turistas e indianos, quase vinte vezes maior.

Atravessamos os jardins da entrada, passamos pelo portao principal, e ali ficamos frente a frente com uma das maravilhas do mundo. Ali em nossa frente, ao final de um estreito espelho de agua que reflete sua imagem, estava ele, o Taj Mahal, provavelmente a mais impressionante obra arquitetonica do mundo.

 

Finalizado em 1653, o Taj Mahal foi construído pelo governante mugal Shah Jahan em homenagem à memória e para preservar o corpo de sua esposa favorita, Mumtaz Mahal que morreu ao dar a luz ao seu 14º filho. A construção do mausoléu levou 22 anos e envolveu 20 mil trabalhadores.

A parte triste da historia veio mais tarde, pois apos alguns anos de sua construcao, Shah Jahan foi desposto por seu proprio filho e imprisionado no Forte de Agra, onde passou os ultimos anos de sua vida, vislumbrando sua obra de arte apenas por uma pequena janela em sua cela.  Apos sua morte em 1666, ele foi enterrado ali, ao lado do corpo de sua esposa.

O branco do marmore refletindo a luz do sol, os contornos perfeitamente simetricos de suas abobodas, figurando sempre o ceu como fundo (um dos requisitos principais de seu projeto inicial), o monumento e de uma grandiosidade tamanha que nao ha como descreve-lo, apenas maravilhar-se e refletir na grandeza dos sentimentos que moveram sua criacao e se materializaram nesta obra prima.

Apos visitarmos o seu interior, seguimos para um dos restaurantes nas redondezas. Muitos deles estao localizados no ultimo andar e possuem mesas no terraco de dali, ainda conseguiamos avistar o Taj Mahal nao muito distante, juntamente com o por-do-sol.

Comecou a anoitecer enquanto jantavamos e um pouco acima do restaurante, um bando de passaros enorme sobrevoava. O bando era mesmo muito grande, pois por varios minutos, eles continuavam passando sobre nos e, com o tempo, comecamos a notar pelo formato de suas asas que na verdade eles nao eram passaros, eram morcegos. E eram enormes.

E olhando para o Taj que ainda era visivel, mesmo na escuridao da noite, com aquele bando de morcegos passando em sua frente, a paisagem tornou-se um tanto sombria, mas ainda fascinante.

Terminamos nosso jantar e seguimos para Delhi e, no comeco da noite chegamos a capital do pais.
 

Jaipur – 09th -10th September 2008

segunda-feira, 13 de outubro de 2008

Pela janela do trem, fomos assistindo as mudancas na paisagem. A vegetacao aos poucos foi se tornando mais e mais escassa, como a evolucao de uma calvicie. Quando entramos no estado de Rajastao, o clima ja havia se tornado arido, o solo de areia carregava pequenos pedacos de vegetacao rasteira e, camelos carregando carrocas.

Jaipur e a capital do estado de Rajastao e tambem a porta de entrada para o deserto indiano. Juntamente com Agra e Delhi, forma o chamado ‘Triangulo Dourado’ do Norte da India, por abrigar grande parte dos suntuosos palacios e monumentos construidos durante o periodo Mugal. A cidade foi praticamente quase toda planejada, durante o periodo do Maraja Jai Singh II, e dai proveio o seu nome ‘Jai’ ‘Pur’ (pur – cidade).

EM 1876, o Maharaja Ram Sigh decidiu pintar a cidade inteira de cor-de-rosa para receber o Principe de Gales, ja que o rosa e a cor da hospitalidade e a cor foi mantida ate os dias de hoje.

Pegamos o rickshaw ate uma das entradas da cidade velha e adentramos por entre o labirinto de vielas que formam um dos seus inumeros bazares, passando por lojas vendendo pedras semi-preciosas alem de muitas lojas de saris. Fiquei tentada a levar um para casa, mas os saris sao enormes, chegando a medir em media 6 metros de extensao! E imagina, aposto que chegando em casa, nao terei nocao de como enrola-lo propriamente.

Apos algumas horas perambulando pelos bazares, nos perdemos, nos achamos, nos perdemos de novo. E, com um mapa na mao, e com apenas um dia para conhecer a cidade inteira, chegamos a conclusao de que nao conseguiriamos ver tudo, pois Jaipur ferve de opcoes turisticas.

Fomos ate o City Palace e ali conhecemos um taxista, que topou nos levar ate os pontos principais por apenas 300 Rupias (por volta de 3,5 libras). O primeiro ponto foi o Iswari Minar Swarga Sal, uma especie de torre (minarete) construida pelo filho do Jai Singh, Iwari (que mais tarde o assassinou).  A subida ingreme e em espiral e um tanto cansativa, mas a vista la de cima vale super a pena, dali consegue-se avistar esta estranha cidade, bem como o Tiger Fort, que fica acima de uma montanha nas proximidades.

Dali passamos a frente do Hawa Mahal, o palacio mais marcante da cidade.  Ele foi construido em 1799 pelo Maharaja Sawaj Pratap Singh, para possibilitar que as mulheres do seu harem pudessem ver dali um pouquinho da vida  la fora, atraves de suas muitas janelas, que assemelham-se a favos de mel. 

Alguns quilometros mais de transito infernal. Ja estamos nos acostumando a este ritmo caotico de suas ruas, desviando de vacas, de rickshaws, de carros, de pessoas, de cachorros e buzinas por todos os lados.

Finalmente chegamos ate o Palacio das Aguas, que era utilizado pelos Marahajas na temporada de caca as aves. Atualmente, cinco de seus sete andares encontram-se submersos no lago que o circunda.

Do lado oposto da rua, uma multidao de pessoas e turistas se aglomeravam. Nos juntamos a eles e dali, de repente, caminhando bem em nossa direcao, apareceu um elefante enorme, carregando um casal de turistas as suas costas.

Em seguida, um rapazinho veio nos oferecer se queriamos dar uma voltinha. Nao resistimos, e subimos nas costas do animal, que lentamente foi nos levando ate a avenida principal.

Estar ali, foi fascinante, e ja valeu o passeio. Mas nao terminou por ali.

Dali seguimos para o Templo do Deus Sol, em Galta, tambem conhecido como Templo dos Macacos. Nosso taxista nos deixou bem na encosta da montanha, a qual o templo esta hospedado ao topo.

O solo de pedras grandes, entre construcoes de ruinas, tinha uma cor meio avermelhada e, tentando desviar das montanhas de esterco no chao, fomos subindo. Os macaquinhos comecaram a aparecer, sem a menor timidez.

Tambem encontramos com varias criancinhas pedintes, que tambem se ajuntaram a nos, e empouco tempo, formavamos um bizarro grupo.

O cenario, ja pelo caminho era um tanto estranho , as casas em ruinas, com os macaquinhos sentados nos seus telhados, assistindo a cidade abaixo. E, se ja nao estava estranho o suficiente, um senhor apareceu em nossa frente, perguntando se queriamos tirar foto com a sua vaca. Recusei e continuei andando, mas so ai percebi que a vaca na verdade tinha cinco pernas, sendo que a quinta saia bem do meio de suas costas! Que lugar louco.

Passamos diversos templos pequenos, onde pessoas bem simples pareciam estar perdidas em seus proprios rituais. De um destes templos, um senhor  aparentando ter problemas mentais, comecou um monologo enorme, olhando direto para mim. Ele falava, falava, sorria, falava de novo e, sem entender o que se passava apressei o passo para chegar logo ao topo.

\Quando enfim chegamos ate o Templo, ja era quase o final da tarde e o sol comecou a se por. Entramos e ali encontramos duas senhoras que nos convidaram a sentar. Elas amarraram uma pulseirinha em nosso pulso e pintaram o ‘terceiro olho’, aquela marquinha vermelha em nossa testa e, claro pediram uma doacao.

No caminho de volta, os macaquinhos ja nos esperavam, ou melhor, esperavam os amendoins que viemos dando no caminho, mas a certa hora, eles comecaram a nos circundar e a puxar a barra da calca do Al e aos poucos foram ficando mais violentos, berrando uns com os outros e vimos que nossa hora ali tinha dado.

Deixamos Jaipur na manha seguinte, fascinados com o que vimos, e sentindo que se tivessemos mais um dia la poderiamos ver muito mais, mas tambem ansioso para chegar em Agra, e finalmente ver o Taj Mahal.

Mumbai – 05th – 08th September 2008

sábado, 4 de outubro de 2008

Meu irmao colecionava ‘comics’ importados. Lembro que num destes haviam algumas historias que se passavam em cidades grandes e, para realcarem a decadencia urbana, os autores as vezes desenhavam um cenario de predios rachados, ratos pelos lixos, mendingos pelas sargetas, pessoas desenhadas como vultos negros perambulando por entre becos.

Quando chegamos em Mumbai, as cinco da manha, foi este cenario que me veio a cabeca. Da estacao, pegamos um trem urbano e, entre vagoes lotados, alguns de pessoas, outros, de uns sacos enormes, chegamos ate a estacao central. Dali, pegamos um taxi, que aqui sao chamados de ‘bumble bee’, pois sao amarelos e pretos, pequenininhos e meio arredondados, parecem mesmo umas abelhinas e em poucos minutos chegamos a area de Colaba.

O taxi nos deixou bem em frente a India Guest House. Chegamos ali meio que sem querer, mas o lugar para nos e historico. Estou lendo no momento ‘Shantaram’, um livro excelente que conta a historia veridica (dizem) do autor, um ex-prisioneiro australiano que fugiu da cadeia e foi cair em Mumbai, onde viveu por varios anos e ali, como no livro, foi o primeiro lugar que ele chegou.

Nao sei se o Gregory Roberts (o autor) teve a mesma visao que nos, mas o predio estava todo forrado por tapumes. A porta de entrada, bem nao tinha porta, era apenas um buraco na parede. Subi as escadas e aos poucos, fui notando que o que estava mantendo as paredes unidas eram ripas de madeira enormes, atreladas umas as outras. As pousadas dos andares abaixo estavam fechadas, provavelmente ja haviam deixado o predio. Conversamos com o gerente e tentamos conseguir um quarto, mas ele queria nos cobrar duas diarias, uma das 6 da manha ate o meio-dia e outra do meio-dia em diante, o que achamos um absurdo.

Saimos pelas ruas de Colaba atras de outro lugar para ficar. Ratos enormes passavam pela rua. Fora de brincadeira, cara, nunca vi ratos deste tamanho em minha vida. Vi o primeiro, vi o segundo, ai desencanei, ali, eu sou a estranha, a estrangeira. Eles estao apenas no habitat normal deles e outra, na India, o melhor e nao procurar, porque voce acha. Acha barata, acha rato, acha umas coisas nojentas.

O ar de Mumbai e outra coisa que ficou na minha cabeca. Kerala cheirava a especiarias, Goa cheirava a haxixe, mas Mumbai…Mumbai cheira a lixo. Mas nao um lixo comum, sei la, tem um odor que e uma mistura, de restos de comida, com urina, um cheiro tao forte, que mesmo depois de senti-lo, ele ainda fica na sua memoria. Ate agora nao consigo esquecer.

Achamos um outro hotel, nas proximidades. O quarto, era o mesmo esquema da India Guesthouse, uma divisao feita com reparticoes, como aquelas de escritorios antigos, sem janela, apenas uma gradinha no topo da parede para nao morrermos sufocados. O banheiro? Coletivo.

Estavamos mortos de cansados entao ficamos por ali mesmo. Descansamos algumas horinhas e quando iamos saindo, comecou a moncao. Pela janela pude assistir a chuva, que comecou de repente, mas com uma intensidade animal e logo as calcadas comecaram a formar pequenos rios.

Sem chances de ela passar tao cedo, assim que a tempestade foi fraquejando, saimos para conhecer a cidade. Das imediacoes de nosso hotel, ate a avenida principal, as calcadas durante o dia ficam lotadas de barraquinhas de camelos e gente vendendo comida na rua. E um transitar de pessoas, rickshaws, cachorros, vacas intenso, e as vezes me pergunto se vim passar as ferias na ’25 de Marco’ em Sao Paulo.

A chuva estava diminuindo mas algumas (varias) pessoas na rua, com jarras na mao, recolhiam a agua que escorria dos toldos. Achei aquilo estranho, mas continuamos nosso caminho ate o Colaba Market.

O mercado e bem simples, com barraquinhas vendendo panelas, artigos para casa bem como alimentos.

Estamos na epoca da celebracao do Deus Ganesh, aquele que tem a cabeca de elefante e, em nosso caminho, varias tendas foram armadas para a adoracao do idolo. Incrivel como com tao pouco, eles conseguem montar um templo, apenas armando a estrutura com bambu, amarrado e a cobrindo com sacos de lixo. Dentro, a imagem do Deus e toda cercada por flores, incensos e oferendas.

Dali, seguimos para o ponto central de Mumbai, o ‘India Gateway’, uma especie de arco de triunfo, que tambem funciona como o ponto  de desembarque de varias balsas para as ilhas proximas.

O monumento foi construido em 1924, para comemorar a visita real do Rei George V as Indias, na epoca em que ainda era conhecida como Bombay (a cidade mudou de nome em 1995, como varias cidades da India).

Os portugueses foram os primeiros europeus a chegar ali e a transformaram em colonia em 1534. Em 1661, eles a usaram como ‘dote’ para celebrar o casamento entre Catarina de Braganca e Charles II, da Inglaterra. Esta por sua vez, ‘arrendou’ a cidade inteira para a Compania Inglesa das Indias Orientais, por meras 10 libras esterlinas por ano!

Bombay, por ostentar um dos mais importantes portos do pais, experienciou um periodo de extrema prosperidade  durante a  Guerra Civil americana, ja que substituiu a America do Norte no fornecimento de algodao para a Inglaterra.

Em 1960, o estado foi dividido de acordo com criterios linguisticos e assim, a cidade tornou-se a capital do estado de Mararashtra e hoje e a mais populosa cidade indiana, com mais de 16 milhoes de habitantes.

A grande populacao deve-se tambem a intensa onda migratoria que existe dentro da propria India, abrigando refugiados vindos das mais diversas areas, acometidos por calamidas como enchentes, secas, ou apenas extrema pobreza.

Muitos deles, como acontece em grandes metropoles (como Sao Paulo) chegam sem ter quaisquer recursos financeiros e a solucao mais obvia e ir para as favelas, que se aglomeram pelos quatro cantos da cidade. Uma unica favela da regiao abriga mais de um milhao de  pessoas!

Saindo dali, fomos ate um templo Jaina, uma religiao anciente da India, onde estava acontecendo um festival religioso. Assistimos um pouquinho da celebracao, onde varias oferendas eram colocadas bem a frente das estatuas de seus idolos.

Seguimos nosso itinerario, e tentamos encontrar a Torre Parsi, que e utilizada pelos praticantes do zoroatrismo como um rito funerario de seus entes queridos. Segundo a religiao, nenhuma parte do corpo humano deve ser desperdicada e desta forma, os corpos nao sao enterrados nem cremados. Sao deixados ao topo desta torre, para serem devorados pelas aves de rapina.

O lugar nao permite a visita de turistas e, desta forma, foi praticamente impossivel encontra-lo, ja que nas redondezas nao encontramos nenhuma sinalizacao, o que foi uma pena.

A noite, voltamos as ruas de Colaba. A regiao toda ferve mais ainda durante a noite, entre turistas, camelos e transeuntes em geral, que a cada passo aparecem ao nosso lado para oferecerem algo diferente….Tenho a impressao que ali, voce encontra o que voce quiser, a qualquer hora.

Chegamos ao Leopolds, um bar local no inicio da noite. O bar povoou minha imaginacao diversas vezes, pois foi palco central de diversas desventuras no livro que estou lendo e, segundo o autor, nos anos oitenta era um ‘hang out’ de ex-pats, traficantes, junkies, e figuras da noite em geral. Atualmente, parece ser o ponto de encontro de fas (como eu) desta otima obra, que caiu no gosto de mochileiros do mundo todo (encontrei muitas, mas muitas, pessoas mesmo lendo o mesmo livro, durante nossa estada na India).

No caminho de volta, as barraquinhas estavam fechadas e os vendedores, dormindo sob elas. Nas calcadas, familias inteiras dormindo tranquilas. Ao ver a expressao serena que elas mantinham em suas faces, comecei a me sentir como se estivesse entrando no ‘quarto’ das pessoas, durante a noite e, acho que de certa forma, estava mesmo.

E ai entendi a cena das pessoas recolhendo a agua das chuvas: provavelmente, e a oportunidade delas de tomar um banho rapido, lavar as maos, ou apenas matar a sede.

Mas apesar da situacao de miseria constante, Mumbai nao e deprimente, pelo contrario, apesar da caoticidade de suas ruas, do exagero de todos os pecados urbanos, a sensacao geral e de que tudo esta no seu lugar certo. E uma sensacao de paz que, confesso, muitas vezes nao senti em lugares mais ‘civilizados’, como Londres. E aos poucos, fui me sentindo parte dali. Nao sei se estou fazendo sentido, mas me senti segura, em paz.

No dia seguinte, fomos conhecer os mercados da regiao, na cidade ha dezenas de bazares, cada qual com a sua caracteristica, escolhemos pelo bazar que vende bijuterias, e seguimos para la.

Quanto mais nos aproximavamos, a aglomeracao de pessoas parecia ser maior. O fluxo era extremamente intenso e a certa altura, fui pega no sentido contrario  e aos poucos, fui me afastando do Al. A sorte foi que encontrei um destes carregadores, que com seus cestos enormes sob a cabeca, nao perdem tempo neste vai-e-vem de gente e, como ambulancias no transito, foi abrindo o caminho para mim.

Nao aguentei. Quando encontrei o Al, dei-me por satisfeita com tudo o que vi e pulamos dentro de um onibus, que lentamente fazia o seu caminho entre aquele mar de pessoas.

Dali seguimos para Chowpatty Beach, nas imediacoes da estacao de Charni Road. Nao estava esperando nadar nem deitar na areia, pois ja havia ouvido falar que o mar e super poluido, ja que varias favelas nas imediacoes o utilizam como banheiro. Mas para passar uma tarde foi uma boa escolha. A pena e que o unico bar na costa estava fechado, entao, fizemos como as varias familias que estavam por ali e paramos nas barraquinhas de comida.

A noite, decidimos ir ate o cinema, ja que estamos bem no coracao da industria de Bollywood, onde mais de 8000 filmes por ano sao produzidos. Infelizmente, nenhum dos filmes em cartaz possuia lengenda em ingles, entao, para nao perder a viagem, nos contentamos em assistir ‘Wanted’.

O filme em si era meio mediocre, mas a experiencia foi um tanto interessante: antes dele comecar, tivemos que ficar de pe, enquanto o hino nacional da India soava nas caixas de som do cinema e, vez por outra, pessoas da plateia dialogavam com os atores.

Ao final, pegamos um dos taxis-abelhinas, que naquele transito, formavam um enxame e seguimos para o hotel.

A manha seguinte, voltamos ao India Gateway e pegamos uma balsa ate a Elephanta Island, uma ilha nos arredores de Mumbai. Na ilha, depois de subirmos uma escadaria enorme, chegamos a um parque, onde varios macaquinhos rodeavam os turistas em busca de comida.

Visitamos as Elephanta Caves que são templos escavados na rocha e uma vez dentro deles, pudemos observar inúmeras esculturas gigantescas de Shiva e Parvati. A mais importante estátua é a Mahesamurti, que apresenta as três faces de Shiva.

O final da tarde, usamos para circular pela cidade, meio que sem destino. Sem querer, caimos dentro de uma favela. Passeamos por entre as vielas, entre os casebres, feitos dos mais diversos materiais. Criancas brincavam pela rua, senhores conversavam em bancos de madeira, mulheres lavavam as roupas em tanques feitos de concreto e, fora um ou outro pedinte que nos abordava, a maioria das pessoas pareciam ocupadas demais com seus afazeres cotidianos para notar nossa presenca.

Voltamos a noite ao Leopolds, para nossa ultima noite na cidade. Ali, conhecemos um inglesinho que estava parcialmente morando em mumbai. Alias, principalmente no estado de Bangalore, varias empresas inglesas parecem estar se estabelecendo no pais, devido a facilidade de mao de obra qualificada e, claro, muito mais barata que na Inglaterra.

Alias, este esta sendo um dos grandes fatores de desenvolvimento economico do pais, que dizem ser um dos maiores mercados emergentes do futuro.

Mesmo com seus pedintes, mesmo com o lixo na rua, mesmo sem as pessoas terem latrinas. A India e mesmo um pais de contrastes.

Goa – Arambol – 31st – 4th September 2008

quinta-feira, 2 de outubro de 2008

O estado de Goa e o menor de toda a India. Os portugueses inicialmente chegaram ali como mercantes, mas aos poucos foram se apoderando do lugar, ate domina-lo totalmente, durante o seculo XVI e ali permaneceram ate 1961, quando GOA foi anexada a India.

Considerando que nao fazem nem cinquenta anos desde sua partida, era de se esperar uma influencia cultural maior. Atualmente, somente os habitantes mais idosos falam o portugues e, apesar de haverem negocios com sobrenomes portugueses, os casaroes coloniais, bem como as igrejas, sao as marcas mais explicitas do seu passado europeu.

No caminho para Arambol, pela estrada de terra, vez por outra cruzavamos uma destas construcoes, e, apesar de parecerem abandonadas, continuam impressionantemente belas, apesar da pintura descascada e jardins abandonados.

Chegamos em Arambol no final da tarde e, logo que deixamos nossas malas, fomos ate a praia. A costa nao e das mais belas, o mar e ate meio lamacento, mas no canto direito ha um lago de aguas doces, como aquele na Praia da Guarda, no Sul do Brasil.

Quando chegamos no lago, alguns turistas circulavam por ali. Alias, a atmosfera em Arambol e bem sociavel, nestes pontos de encontro onde os turistas geralmente vao. Ali na areia, entre mar e o lago, conhecemos Cris, um americano de Tennesse que havia largado a faculdade para viajar pela India. Ali tambem conhecemos a Iada, uma austriaca que havia chegado para trabalhar numa associacao de caridade.

Quando comecou a escurecer, fomos jantar num dos restaurantes na frente da praia. Alias, na praia mesmo, uma vez que as mesas sao sob a areia. Ali, com o ceu super estrelado, a luz de velas, saboreamos um otimo curry de camarao.

Apos o jantar, fomos para o bar vizinho que a noite passa filmes piratas e tem mesas de snooker. Encontramos com o Cris, que estava numa mesa com um alemao, chamado Patrick e dois indianinhos, Raj e Prakesh, da regiao de Manali e ali, entre varias cervejas, passamos nossa primeira noite em Arambol.

Na manha seguinte, depois de tomar um cafe da manha delicioso ali de frente para o mar, seguimos para o lago.

Cris apareceu por la, com um grupo de ingleses e ficamos por ali, conversando, nadando e tentando fugir das vendedoras de bugigangas que nao nos davam sossego. A certa altura, quando estavamos todos dentro da agua, elas sentaram num tronco e ficaram ali, nos esperando sair, embaixo daquele sol forte. Aquela coisa de ‘Discovery Chanel’ mesmo, o predador vai a caca nas proximidades da agua, porque sua presa ira para aquela regiao a uma certa altura…

Quando sai da agua, comprei um colarzinho para ajuda-las, mas assim que fiz isto, umas outras tres me cercaram…Prometi para mim mesma que nunca mais iria fazer isto, pois to ficando com um monte de bugiganga que nao vou usar e ao inves de me deixarem em paz, ai que elas colam mesmo!

Dali, subimos ate uma montanha proxima,cruzando por um pequeno rio.

Ao chegar ao topo, encontramos uma bela banyan tree (figueira) , que parece ser o local preferido dos campistas, o que eu acho uma loucura, pq a area ainda eh super florestal e deve ferver de mosquitos!E, francamente, voce precisa gostar muito de camping para acampar na India, onde o preco da hospedagem chega a 150 rupias (menos de 10 Reais).

A noite, seguimos para o ‘nosso’ barzinho na praia. Ali, encontamos o Cris, Patrick, Raj e Prakesh. Enquanto o Alistair e eles se revezavam na mesa de sinuca, comecamos uma conversa animada sobre os habitos e costumes da India.

Ha algumas semanas atras, um turista briacaco havia tentado arrancar uma cruz do chao, na frente de uma Igreja em Arambol. Inicialmente foi confrontado por alguns locais. A confusao foi atraindo mais e mais pessoas que ao saberem do ‘feito’ do infeliz, resolveram por ali castiga-lo e o lincharam ate a morte, ali mesmo, bem ao lado da cruz.

Linchamentos publicos, crimes por honra, guerras de castas, tudo isto ainda e bastante presente na realidade do indiano. E nao e apenas fofoca de bar nao, comprei uma revista, tipo a Veja e, do comeco ao fim, a revista veio recheada de artigos sobre isto.

Na mesma noite, Raj ao saber que era do Brasil, veio me apresentar o dono do bar, o Joao, de Portugal. Ele era um militar aposentado, que havia vendido tudo em Portugal e imigrado para Goa. Eu ja o havia visto na praia, pois assim que ele pisou na areia, todos os cachorros da praia correram em direcao a ele e comecaram a latir. Fiquei intrigada, mas agora entendi: e ele quem os alimenta!

Tambem nesta noite, conhecemos  um portuguesinho que havia terminado a faculdade em Portugal e decidido fazer mestrado em Goa (!). E havia chegado a Arambol ha tres anos atras, se apaixonou pelo lugar e resolveu ficar por ali. Passamos a noite inteira conversando e combinamos de na noite seguinte ir ate a uma rave. Nao perguntei o que ele fazia para sobreviver em Goa, mas ao ver ele e o Raj conversando sobre o que levariam para a festa, entendi que ele deveria vender drogas.

Nao tenho nada contra drogas leves. Muito pelo contrario. Mas drogas pesadas, cara, ach que sao baixo astral. E na India toda tem uma leva de turistas que vem para ca apenas atras de ‘brown sugar’, heroina. Alguns vem para ca apenas com este intuito, compram o maximo que podem (que aqui e barato) e passam semanas completamente fora de si, para depois voltarem para seus paises, onde retornam as suas vidas normais.

Eu realmente nao vejo o ponto em tudo isto, mas enfim, cada louco com a sua mania.

No dia seguinte, eu, Al, Cris, Patrick e um inglesinho que nao lembro o nome alugamos umas motinhos e fomos explorar a regiao. O caminho ate la foi fantastico, passando por vilas, casebres, campos. Numa destas passagens, Cris derrapou com a moto e teve um pequeno acidente. Os habitantes da vila logo se prontificaram a ajuda-lo, e trouxeram um copo de agua, ja que ele parecia bem nervoso. Ao ver o copo, acho que ele ficou ainda mais nervoso, pois todos os guias de viagens sobre o pais te dirao para ter cuidado com a agua. Tambem dizem que 70% das pessoas sofrem de diarreia nas primeiras duas semanas, mas ate agora nada aconteceu, nem conosco, nem com todos que encontramos no caminho, ja que esta virou uma pergunta tipica entre os mochileiros na India.


Nosso destino era um forte que ficava numa peninsula oposta onde estavamos. Para chegar la, pegamos uma balsa.

O comandante, ali de sua cabine, de repente me chamou para ir ate la em cima. Fui, pensando que dali poderia tirar uma foto e pronto. Ele me chamou e, largando o leme, gesticulou para que eu assumisse o controle. Achando que daria uma bela foto, topei.

Ele entao, de repente se afastou e deixou a balsa sob meu controle total. Apos alguns minutos e, com a foto feita, quiz devolver o leme para ele, mas ele nao aceitou.

Cara, que loucura, nao so dirigi a balsa o caminho inteiro, como tambem


tive que estaciona-la. Gente estes indianos sao loucos!!! Por isto to amando este pais, hahhaa, imagina em nenhum lugar do mundo eles me deixariam fazer isto !!!


Fomos ate o forte (que hoje funciona como um hotel) e na volta, decidimos voltar ate Anjuna, pois toda quarta-feira tem um mercado de rua que e bem conhecido. Eu e o Al estavamos receosos de chegar la e encontrar um monte das vendedoras insistentes da praia, o que seria um inferno, mas enfim, pegamos a estrada para la.


No caminho, avistamos o portuguesinho que conhecemos no bar, empurrando a sua motinho. Achamos que ele estava sem gasolina, por isto, eu e o Al logo paramos e fomos ver se estava tudo OK. Cara, tentar falar com ele era inutil: ele estava completamente fora de si, salivando muito e suando mais ainda. O olhar perdido nao nos reconhecia e nao havia nem a sombra daquele cara bacana e inteligente com quem passamos a noite conversando. Perguntei se ele queria uma agua, mas quando fui buscar, os outros motoqueiros que estavam conosco retornaram para ver porque haviamos parado e, com isto, ele se assustou e continuou empurrando a moto, so que com mais velocidade. Pensei que ele nao queria ser incomodado e fiquei mais tranquila de ver que ele teve o bom senso de empurra-la ao inves de dirigi-la.


Uns dez quilometros mais para frente, encontramos com o Mauricio, (acho que israelense) que tambem conhecemos na noite passada. Gente, ele tava bem numa destas vilas bem simples que passamos, caido no chao, completamente desmaiado, uma de suas pernas estava caida bem no que pareceu ser o esgoto da vila, galinhas passavam pelo seu corpo, as pessoas desviando e ele la caido. Foi chocante. Claro, eles devem ter tomado um ‘smack’ ha alguns minutos atras e agora tavam assim, doidoes. Nunca havia visto alguem ter viagem de ‘smack’ e confesso, nunca mais quero ver: ali, completamente desmaiado, a expressao facial que a pessoa fica eh de terror e nao de paz, quando esta apenas dormente. Alem disto, em viagem voce fica normalmente num estado de alerta meio que constante, nao paranoico, mas sim de cuidado. E ali, caido, qualquer pessoa poderia fazer o que quizesse com ele que ele nem sentiria. Pessimo.

Chegamos em Anjuna, mas infelizmente o mercado ainda nao estava funcionando (somente a partir de OUtubro – Dez), entao fomos ate o Chillies, no final da praia, comer lula a dore.

Na volta, as vendedoras de Anjuna (que sao muito mais hardcore que as de Arambol) cercaram Cris e Patrick e, eles levaram uns bons 20 minutos para se livrarem delas.

No caminho de volta, de longe vimos uma multidao no meio da estrada. Ao nos aproximarmos, pudemos ver o que restou do acidente que havia acabado de acontecer. Duas motos se chocaram, acho que praticamente de frente, ja que nao havia marcas na estrada de pneu, apenas um solitario capacete repousado no asfalto. As motos, ambas, estavam num estado assim, chocante, uma delas, o eixo das rodas, o guidao e a lataria da frente havia tomado o contorno de uma linha reta, a outra, uma destas motinhos de turistas como as que estavamos usando, estava totalmente despedacada.

O impacto, para deixar este estrago todo, deve ter ocorrido numa velocidade alta, o que e estranho, em goa, fora os onibus, a maioria das pessoas dirige com cuidado.

Retornamos nossas motos assim que chegamos em Arambol e fomos jantar. Mais um jantar, com as estrelas, comida deliciosa e barata….Ai, Goa, voce e a minha ideia de paraiso…

Seguimos para o nosso bar, como uma rotina que em poucos dias criamos, encontramos com as pessoas de sempre, Prakesh veio nos chamar para a rave, mas tava um pouco cansada do dia, entao deixei para la. Nem sinal dos meninos que conhecemos na noite passada…

Na manha segunte, arrumamos nossas coisas para ir embora, com o coracao apertado. Passei na loja do Prakesh para me despedir e, recebi a noticia: o acidente que vimos na estrada era mesmo o portuguesinho do bar. Ele havia sido levado para o hospital, sofreu traumatismo craniano e lesoes cerebrais ate o momento tidas como irreversiveis. Os meninos que o visitaram no hospital disseram que ele apenas mexia alguns dedos e nao falava coisa com coisa.

Como uma historia em quadrinho, vi todas as cenas dos acontecimentos, ele combinando com o Raj dasdrogas que iria pegar, ele na estrada carregando a moto, o Mauricio ali caido, as motos destorcidas do acidente e agora, o Prakesh me dando a noticia. Provavelmente, nos fomos as ultimas pessoas a conversarem com ele pelo que parece, ate o final da vida dele.

Acho que quando ele melhorou, ele provavelmente tentou dirigir mas se esqueceu que em Goa os sentidos sao contrarios, como na Inglaterra. Sai de la com uma sensacao pesada no estomago, nos poderiamos te-lo impedido de voltar para a estrada, mas sera que seria suficiente? Acho que nao, pois quem entra nesta onda de heroina, coloca a vida toda na contra-mao, o tempo todo.