Posts com a Tag ‘Vienciane’

Laos – Vientiane

sábado, 24 de janeiro de 2009

Somos um casal internacional. Eu sou brasileira, ele e australiano e nos dois passamos uma boa parte de nossas vidas em Londres. Consequentemente, temos amigos espalhados por quase todo o mundo.

Durante nossa viagem, tentamos encontrar com varias pessoas que conhecemos, mas, como fomos fazendo nosso roteiro assim meio as pressas, algumas vezes rolou, outras nao, afinal as pessoas tem seus proprios planos tambem.

E em Vientiane aconteceu a mesma coisa. David e um amigo do Al da epoca da faculdade. Eles, assim que se formaram em Geologia, fizeram uma viagem fantastica de Melbourne a Perth, onde estao as maiores empresas de mineracao da Australia. Atravessaram o deserto no centro do pais e batalharam juntos pelo primeiro emprego depois de formados.

Depois de muitos anos, o Al se mudou para a Inglaterra, comecou uma carreira nova em IT e os dois meio que perderam contato. David continuou trabalhando como geologo. Morou na Tailandia, Bali e Laos, onde casou com uma residente local e teve dois filhinhos lindos.

Conversamos com ele algumas vezes durante a viagem e pegamos seus contatos. Infelizmente, nas proximidades de nossa vinda a Laos, ele mudou-se para Jakarta, em funcao do trabalho. Mas nos convidou para ficar na sua casa.

Chegamos em Vientiane e ligamos para Tutka, a cunhada do David. Ela veio nos buscar no aeroporto, com uma amiga super simpatica. Nossa, nos ultimos meses foi um tal de chegar ir atras de taxi, ir atras de hotel, carregando a mochilona, que esta gentileza de vir nos buscar teve um valor todo especial.

Elas chegaram em poucos minutos e no caminho viemos o tempo todo conversando. Parecia que nos conheciamos ha tempos! Vieram nos mostrando os principais pontos turisticos da cidade, e a certa altura perguntaram se queriamos ir para a casa ou ir para a balada com elas.

Embora estivessemos um pouco cansados, nao resistimos. Pegar balada com a galera local e outra coisa. E assim fomos ate um dos bares as margens do Rio Mekong.

O bar era lindo, com decoracao bem cuidada, fontes artificiais, e uma area de vidro separada, onde estava o grupo de amigos que elas haviam deixado para ir nos buscar no aeroporto.  Aparentemente, Tutka& friends estavam no ultimo ano da faculdade de Business e, como todos em vida universitaria, tinham uma vida social super agitada.

Foi tao louco, olhando ali para eles, tive um flashback. Nos meus tempos de faculdade, era exatamente isto


que estava fazendo, era este o jeito que pensava. E, como sou mestica, nossa aparencia tambem era fisica. Foi muito doido, me identifiquei com elas pra caramba. Quando tinha a idade delas tambem era assim, se me perguntassem meu nome, nao saberia responder. Mas sabia nome, endereco e codigo postal de todos os bares de Sao Paulo!

A noite estava otima. A balada em Vientiane e agitada, as meninas se produzem no ultimo e vinho e coqueteis parecem ser mais populares que a Lao Beer.

Tambem e costume mudar de bar varias vezes durante a noite. E assim, nos, nossas anfitrias e cia, seguimos para o bar seguinte.

Este era mais um club do que um bar. O som altissimo vinha acompanhado de um show de luzes super

intrigante: muitos, muitos, muitos feixes de luzes, como aquelas canetinhas que emitem um fio de luz vermelho, movimentando-se com rapidez pelo ambiente. O som mudava a cada dez segundos. Definitivamente, para o DJ quantidade era sinonimo de qualidade. Ou ele estava tentando tocar a musica preferida de cada um do club que por sinal estava lotadesimo.

Mesmo com o barulho, conseguimos conversar bastante e, quando comecei a falar do Brasil, percebi o quanto longe de casa estava. Foi a primeira vez que me dei conta do quanto ja rodamos, quao geograficamente estamos afastados, aqui em Laos, um pais que quase nunca aparece nos noticiarios.

E ouvi tambem muitas historias, a menina que gostava do menino, que estava ali atras da agente, mas que ele nao prestava atencao a ela. Que ela jah havia se declarado, mas ele gostava de outra. Dos sonhos de cada um apos terminar a faculdade. Da vontade de conhecer o mundo. Dos pais, da familia, das viagens com os amigos. E cheguei a conclusao que, no mundo, por mais diferentes que sejam nossos paises e  costumes, a essencia do ser humano e igual.  Nos apaixonamos, sonhamos, batalhamos de maneira parecida. Cuidamos de nossa familia, buscamos por bons momentos, curtimos nossos amigos de maneira exatamente igual.

Nesta mesma noite, mudamos de bar mais outras duas vezes. E, no final, confesso, estava acabada. Ai o flashback acabou e vi que nao estou mais na epoca da faculdade, e que carrego comigo mais de dez anos de balada que eles e implorei a Tutka para irmos embora.

Viemos de carro pelo caminho, com uma das meninas pendurada numa das janelas, tomando ar e dando boas risadas de nossa noite.

Chegamos na casa de David, que fica na mesma area da casa dos pais de Tutka.  A casa tinha o estilo arquitetonico das construcoes em Laos: a area maior fica no piso superior, que eh suspenso por colunas. O telhadinho oriental, a varanda ornamentada com detalhes em madeira. Por dentro, era linda. E enorme. Lembrando dos lugares que ficamos durante a viagem, parecia que estava delirando.

Dormimos super bem e pela manha, Tutka veio nos chamar para tomar cafe da manha na casa dela. Estavamos numa ressaca animal, monstruosa. Seguimos para la. Os sogros do David estavam sentados a mesa, calmamente lendo os jornais.

Comecamos uma conversa super prazeirosa sobre o pais, a economia e sobre nossas vidas.

Tutka comecou a servir o cafe-da-manha. Nao sei se ainda estava alterada da noite anterior, mas cai de amores por eles. Os pratos comecaram a ser servidos, primeiro, o arroz grudadinho, que aqui chama-se ‘sticky rice’. Depois, uns peixinhos a milanesa. Varios vegetais diferentes e molhos ainda mais diferentes. E o prato principal: numa travessa, um monte de bichinhos cozidos a vapor.

Olhando de longe, pareciam gafanhotinhos descascados. Nao dava para distinguir bem o que eram, mas dava para ver que eram insetos. Dava para ver os olhos, as perninhas, as antenas. O pai da Tutka entao explicou que eram larvas de vespas. Aqui em Laos tem uma especie de vespas que sao enormes e super perigosas. A picada e tao forte que chega a matar.

Tais vespas colocam ovos sob a terra e quando estes tornam-se larvas, sao retirados e vendidos para o consumo.

Nao sei se ainda estava meio alta da noite anterior, ou se a simpatia deles me deixou meio embriagada, ou se estava curiosa, ou se esta viagem me abriu tanto a cabeca que nao me assusto com mais nada, ou se tudo isto junto. Mas provei os insetinhos e, posso ser sincera? Adorei. As larvinhas de vespas tem sabor de camarao e temperadinhas com os molhos certos, sao uma delicia.

Quem me conhece sabe que sou meio fresca para comer. Mas isto me mostrou como deixamos de fazer coisas por bobagens que colocamos na cabeca.

Depois do cafe, eles nos levaram ate o centro. O calor la fora, juro nao tinha comparacao, ganhava de Piracicaba ou Ribeirao Preto. O sol estava ardendo. E nos ali ressacados, meu, tava foda. Paramos num cafe e tomamos tres ‘watermellow shakes’ cada. Aqui eles fazem este suco que nada mais e do que melancia batida com gelo, que e uma delicia no calor.

Quando tomamos coragem, seguimos ate o Talat Sao, um mercado gigantesco. Dali, seguimos para a Promennade, uma passarela as margens do Rio Mekhong cheia de restaurantes e barraquinhas oferecendo massagem.

Dali, no lado oposto a margem esta a Tailandia. Parece tao pertinho! Em funcao da localizacao, a cidade de Vientiane teve um passado historico super turbulento. Laos na verdade, antes dos franceses chegarem, era um agregado de povoados distintos, que viviam em conflitos e invasoes constantes.  O mais proximo que o pais veio a conhecer de unidade territorial foi no seculo XIV, quando a cidade de Wieng Chang (Vientiane) foi conquistada juntamente como parte do norte da Tailandia, Luang Prabang bem como outros povoados regionais, por Fa Ngum.


O territorio passou a ser conhecido como Lan Xang, que quer dizer a Terra de Milhares de Elefantes. E assim permaneceu por mais alguns reinados, ate que durante o seculo XVIII, Lang Xang sucumbiu aos avancos siameses no pais.

Os franceses, que ja haviam conquistado o Vietnam, negociaram um tratado com o Siao dividindo as terras de acordo com o contorno do Rio Mekong e assim, surgiu Laos, como conhecemos hoje. O dominio frances na regiao pouco fez para seu desenvolvimento. Apenas permitiu a producao de Opium local, que rapidamente prosperou em larga escala.

Por sua diversidade etnica, levou um certo tempo ate seus habitantes locais formarem um pensamento nacionalista comum e enxergarem que os franceses ali estavam na verdade sobrando.  E este somente aconteceu apos a Segunda Guerra Mundial, quando o exercito japones que dominou a area durante a guerra retirou-se da regiao. O movimento apenas existiu para impedir que os franceses retomassem seu dominio.

A nova nacao independente tambem sofreu periodos de extrema instabilidade politica, que levou a formacao de duas faccoes principais: os Pathet Lao, apoiados pelos Vietnamitas do Norte, China e a extinta Uniao Sovietica e a elite de direita, apoiada pelos Estados Unidos.

Este ultimo, com o avanco do comunismo no restante do Sudeste da Asia, via no pais a chance de conter o movimento. E, como sempre, resolveu acabar com o problema da melhor forma possivel (para eles) e assim, de 65 a 73, Laos se tornou o pais mais bombardeado do planeta. O Leste e o Nordeste do pais foram totalmente devastados pelos EUA.

A ofensiva, como sempre, saiu pela culatra e o partido de direita somente perdeu o apoio da populacao. E estranho ver a mesma historia se repetindo, mudando-se apenas os personagens. Corrigo, um dos personagens, pois o outro aparece sempre, e sempre e sempre  na historia dos conflitos do mundo.

As tropas americanas deixaram o pais em 1973 e em dois anos, os comunistas tomaram o poder e a Republica Democratica do Povo de Lao foi criado.

Ao longo dos anos, o governo percebeu o declinio das nacoes socialistas e o regime esta mais aberto aos mercados internacionais e o pais espera prosperar com a construcao de estradas que colocarao em contato os paises com os quais faz borda.

Mas tais mudancas levarao tempo e atualmente e considerado um dos menos desenvolvidos paises do Sudeste Asiatico.

Vientiane como capital e  bastante distinta. Com apenas 200 mil habitantes, em plena luz do dia a cidade e bastante tranquila. Nao ha quase transito e por voltas nos vemos quase que sozinhos, caminhando entre as belas ruas arborizadas.

Templos aparecem a cada minuto e monges circulam livremente pelo ambiente. Entramos na area de Th Setthathirat, uma rua principal cheia de barzinhos e restaurantes que parece ser o reduto dos expatriados. Estes sim, aparecem com uma certa frequencia aqui e ali. Fico pensando no David, trabalhando por aqui por tantos anos, com familia e sem dominar o idioma. Acho que aqui e que nem Londres, tem bastante estrangeiros morando na cidade e assim, eles formam os seus grupos e e facil viver bem, falando apenas o ingles (ou frances, que ainda e ensinado nas escolas).

Voltamos para a area do Rio e ali assistimos ao por-do-sol, lindo.

No dia seguinte, nos despedimos de Tutka, que foi para a Tailandia com a mae. Ela nos deixou a chave do jipe do David e assim, aproveitamos nossas ultimas horas na cidade para fazer um pouco mais de turismo.

Como Luang Prabang, Vientiane tambem tem uma forte presenca francesa em seus monumentos e vias. Aqui tambem tem um Arco do Triunfo, que e chamado de Patuxai e, como a Champs Elisee, fica bem ao final da via mais importante da cidade, a Th Lan Xang.

Nao muito distante dali, fica a Pha That Luang, o monumento mais importante da cidade, pois alem de celebrar o Budismo como religiao oficial do pais, tambem e um simbolo de sua independencia politica. Diz a lenda que ha um pedaco do osso da caixa toraxica de Buda enterrado nesta area, mas o fato ainda nao foi confirmado.

O lugar e simplesmente fantastico e e aqui que ocorrem as principais celebracoes da cidade.

Terminamos nosso tour com um almoco delicioso as margens do Rio. E assim nos despedimos de Laos. No horario marcado, pegamos nossas malas e seguimos ate o aeroporto. Hoje a noite, atravessaremos mais uma fronteira: Vietnam! Vejo voces la.